As
aulas de música têm corrido a um ritmo meio irregular. Com as crianças de
Educação Individual, às segundas e terças feiras na sede Mama Alice, é bastante
fácil: dois grupos de seis miúdos, num ambiente controlado, e com a presença
das duas professoras que trabalham com eles. Eles vêm a todas as aulas,
conheço-os pelo nome e aprendem com bastante facilidade porque não há confusão
e sou uma professora para seis alunos. Um luxo.
Nos bairros a história é outra.
Não há obrigatoriedade de presença (não há como obrigá-los), um dia vêm uns outro
dia vêm outros, um dia não vêm porque têm de ficar em casa a tomar conta do
irmão bébé, outro dia é porque se esqueceram das horas e chegaram no fim da
aula, outro dia ainda é simplesmente porque o baloiço ou os matraquilhos são
mais apetecíveis e dizem-me sem pudor: “Professora hoje não quero.”. Das cerca
de trinta crianças que tive em cada centro nas primeiras aulas passei para dez
ou quinze nas últimas semanas. E eu andava desanimada. Mas em cada viagem de
autocarro, questionando-me quantas crianças iria ter nesse dia, pensava sempre
que mesmo que fossem só três ou quatro valeria a pena ir por elas. E a verdade
é que tenho alguns pouquinhos alunos fiéis, que vêm sempre, que chegam antes,
que quando me vêm chegar já perguntam o que vamos fazer hoje, e que quando eu
chamo para a aula (qual vendedora de mercado: “Clase de música ahorita, vamos
empezar!”) deixam o baloiço, as bonecas e os matraquilhos e vêm correndo. Não
se pode agradar a todos, mas se agrada a alguns, já vale a pena. E confesso que
quandos as aulas correm bem nestes centros dos bairros, são muito mais
entusiasmantes e divertidas que as de Educação Individual.
Hoje tive uma surpresa feliz. No
bairro de Keiko Sofia a sala de aula encheu como não enchia desde a primeira
aula. Quase não cabíamos todos. Estavam os meus alunos fiéis e alguns novos. A
aula correu maravilhosamente bem. Ensinei-lhes o que são sons graves e agudos e
aprenderam logo à primeira. Participaram entusiastas e fartámo-nos de rir
juntos. E como estamos a ensaiar a canção de Natal que eles vão cantar na Festa
de Natal Mama Alice, eu decidi fazer um vídeo do ensaio para lhes mostrar como
já cantam bem. O resultado foi este, e eu estava à beira das lágrimas.
Depois pediram-me para cantarmos
a Canção do Leão (Canción del León, na versão peruana). Esta foi a primeira
canção que lhes ensinei quando comecei a trabalhar aqui. E tal como para os
meus alunos do ano passado na Escola Primária de Vale Flores, também aqui a
Canção do Leão é um sucesso. E agora é um sucesso internacional.
Porque as crianças são crianças em qualquer lugar do mundo, e não há criança que não goste de cantar.