As minhas semanas em Ayacucho
começam com a reunião de coordenação que acontece todas as segundas-feiras às
oito da manhã na sede da Mama Alice. Cada um dos grupos de trabalho – Educação,
Assistência Psicológica e Social, Saúde e Bem-Estar, Educação Técnica e
Direcção - reúne-se para avaliar a semana que passou e programar a semana que
vai começar, discutir problemas e preparar actividades. Esta reunião é a oportunidade
de interagir com todos os membros do grupo de Educação, ao qual pertenço, pois
durante a semana estamos espalhados pela sede e pelos dois centros e nunca nos
encontramos todos. Normalmente a reunião começa sempre com uma dinâmica de
grupo, organizada pela coordenadora, que pode ser um pequeno jogo de equipas,
uma conversa a pares ou uma tarefa qualquer, para fomentar o espírito de grupo
e o à-vontade entre todos os educadores. Faz-me lembrar os escuteiros. Devia
fazer-se mais disto, semanalmente, nas empresas.
Para mim é puxadote ter uma
reunião logo à segunda-feira assim tão cedo. Mas aqui é perfeitamente normal. O
sol nasce às seis da manhã e a partir dessa hora começa o barulho de gente e
trânsito na rua. Aliando o ruído à ausência de estores nas casas, o que faz com
que (mesmo com cortinas escuras) a luz invada o meu quarto sem qualquer pudor,
leva a que eu acorde invariavelmente entre as seis e meia e as sete da manhã.
Sem despertador. Às segundas-feiras levanto-me para a reunião. Nos outros dias
viro-me para o outro lado e fico mais um bocado na ronha. Mas só um bocadinho,
porque pelas oito e meia já parece que o dia vai adiantado tal é a azafama das pessoas
no seu ir e vir, e quando me levanto depois desta hora fico sempre com a sensação
que é quase hora de almoço (e até é, pois aqui almoça-se ao meio-dia).
Tenho as restantes manhãs da
semana livres. Aproveito para preparar as aulas, ir às compras, limpar a casa, ir
ao “meu escritório” na associação para me ligar à net e comunicar convosco. E
quando não tenho nada para fazer, vou passear pelas ruas do centro da cidade.
Agora descubri que há uma piscina municipal e vou começar a ir nadar.
Pelas tardes, a partir das três,
tenho as aulas de inglês e de música. Segundas e terças-feiras fico na sede, a
trabalhar com as crianças de Educação Individual (dois grupos de seis meninos e
meninas, uma turminha pequenina, muito familiar) e nos restantes dias apanho um
microbus a rebentar de gente pelas janelas e vou para os bairros onde estão os
dois centros Mama Alice (com a minha viola às costas; não bastasse ser gringa,
o que já faz com a que as pessoas fiquem a olhar para mim, quando vou com a
viola no bus sinto-me um autêntivo freak
show. E efectivamente, sou).
Sala de Educação Individual - sede Mama Alice
Nos bairros tenho turmas maiores, entre vinte e trinta miúdos, muito
sujinhos, muito pobrinhos, mas extremamente interessados, ávidos e desejosos
das aulas. Até agora têm corrido muito bem, à parte a desorganização e o caos
típicos sul-americanos, ao qual me vou habituando pouco a pouco. Ao contrário
do que acontece com as crianças de classe média das escolas portuguesas, aqui não
passo metade da aula a mandar calar, puxar orelhas ou pôr de castigo. Aqui as
crianças precisam de algumas regras firmes (não só de abraços, beijinhos e
festinhas na cabeça) mas têm tal carência de presença e acompanhamento adulto
que são extremamente agradecidas e muito respeitadoras. E ficam histéricas
quando chego, e fazem fila para me cumprimentar. É comovente :)
Centro Mama Alice no bairro de Keiko Sofia
Centro Mama Alice no bairro de 11 de Junio
Quando regresso a casa pelas sete da tarde já está escuro como breu e
normalmente acabo o meu dia a ver um filme ao jantar e a deitar-me às dez da
noite. Inacreditável, pois é. Mas o ritmo aqui é deitar cedo e cedo erguer,
sobretudo não tendo televisão nem internet em casa, e acordando (involuntariamente)
tão cedo, ao chegar ao fim do dia já estou de rastos. Boa noite! *
Olá Sílvia!
ResponderEliminarAinda não tinha tido a oportunidade de te dar um "feedback" dos teus "preciosos" relatos.
Pelo que contas é um "mundo" muito diferente daquele a que estamos habituados. Mas também deve ser uma boa "experiência pessoal".
Com certeza muito mais irás ver e puderes apreciar. Continua a tua "caminhada" porque ela será importante na tua vida futura.
Beijinhos de Portugal do amigo,
António Serra
Olá minha querida Silvinha.. fico conmovido com teus relatos, sinto-me muito feliz de saber que tudo esta a correr bem! Tenho a certeza que esta nova experiencia era mesmo o que tu precisavas e tambêm aquelas crianças que vao disponibilizar de uma excelente professora, motivada, inteligente, amorosa e com vontade de aprender ensinando. Simultáneamente fico feliz de saber que de uma forma indirecta eu te empurrei para que tomares a decisão de mudar tua vida, deixando atrás lindas experiências que partilhamos para viver umas novas onde, tenho a certeza, acabaram por pincelar tua maravilhosa personalidad e assim encontres teu centro vital neste mundo.
ResponderEliminarTenho saudades tuas! Além de tudo o dito anteriormente, tenho que dizer que admiro tua redacção, supera muitas obras literárias!!, parabéns.. continua pelo caminho que dita teu coração e lembrate que os sonhos sempre são possíveis..
Com muito carinho, Robertinho.
Bjs desde Barcelona.