Eu cheguei às sete da manhã a
Ayacucho e sabia quais as pessoas que me vinham esperar, mas não sabia como
eram. Foi a minha colega de casa, Celsa, espanhola de Valência e psicóloga na
Mama Alice, que me identificou. Também não seria difícil, pois a mala, a
mochila, a viola, a estatura, o cabelo e as feições denunciavam-me. E em casa
esperava-me uma recepção um pouco menos calorosa mas igualmente querida, com
direito a cartazes na parede do quarto e almoço de boas vindas com o grupo de
amigos da Celsa.
Ayacucho é uma cidade amorosa
cercada de montanhas e encaixada a dois mil e setecentos metros de altura. Nos
primeiros dias senti alguma dificuldade em respirar e um cansaço extremo, mas
depois passou. A cidade é famosa porque foi aqui perto que ocorreu a última
batalha que ditou a libertação não só do Perú mas de toda a América Latina do
domínio espanhol. E os seus habitantes são muito orgulhosos disso. Também é
famosa porque nos anos oitenta e noventa esta região foi palco de episódios
marcantes de violência por causa do grupo terrorista Sendero Luminoso, que
fazia guerrilha para tentar derrubar o governo de direita e instalar uma
república comunista. Nunca conseguiram e entretanto o líder foi preso, mas
muitas pessoas despareceram e morreram durante esse período. Hoje em dia, todos
os habitantes de Ayacucho que têm a minha idade têm uma história de morte ou
desaparecimento na família próxima. Felizmente, o grupo terrorista desfez-se e
hoje Ayacucho é uma cidade pacífica. Sem dúvida pobre, mas pacífica. E com
alguns poucos turistas, e outros tantos voluntários estranjeiros, de modo que
não me diluo na multidão mas sinto-me um pouco menos extra-terrestre do que em
Lima.
O centro da cidade é uma praça, a Plaza de Armas, igual a todas as
cidades sul americanas de colonização espanhola, rodeada de arcadas e edifícios
importantes (catedral, câmara municipal, centro cultural e muitos bares e
restaurantes), onde desembocam ruas cheias de lojas de todo o tipo. Uma das
ruas leva ao Arco de San Francisco, antiga porta da cidade. E aí perto está o
mercado. Ahhhh o mercado. Adoro mercados. E este é uma verdadeira esperiência
esotérica, de contrastes. Frutas de todos os tipos, lindas cheirosas e muito
apetitosas. Legumes que nunca tinha visto. Pão, queijo e carne ao ar e às
moscas, com um cheiro de dar náuseas. E sumos frescos, feitos no momento, em
que quase quatro copos custam cerca de um euro. E artesanato. Ahhhhhh o
artesanato peruano. Mantas, tapetes, bolsas, calças, camisolas, garruços,
cachecóis. Já sei com o que é que vou encher os meus vinte e três quilos de
mala daqui a dez meses.
As pessoas são genericamente amáveis. E o grupo de amigos da Celsa acolheu-me bem. É um grupo heterogéneo, com tanto de peruanos como de estranjeiros, com a particularidade de nenhum deles ser de Ayacucho, o que faz com que ao estarem todos cá sozinhos o grupo de amigos se torna a família, e fazem muitas coisas e passam muito tempo juntos.
A minha rua, com vista para as montanhas: Jirón Callao
Plaza de Armas
A Catedral e Estátua do General Sucre, um dos libertadores do Perú e da América Latina
A Porta de San Francisco
Gelado artesanal de leite e sésamo, disponível aos fins de semana na Plaza de Armas
As pessoas são genericamente amáveis. E o grupo de amigos da Celsa acolheu-me bem. É um grupo heterogéneo, com tanto de peruanos como de estranjeiros, com a particularidade de nenhum deles ser de Ayacucho, o que faz com que ao estarem todos cá sozinhos o grupo de amigos se torna a família, e fazem muitas coisas e passam muito tempo juntos.
Agora estou no meu quarto
cor-de-rosa, com muita luz e sem estores, com muito sono e um bocado atordoada.
Estou no Perú. Estou em Ayacucho. E depois de amanhã começa o meu voluntariado.
So let the games begin.
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